Desde o dia 1 de dezembro de 2011, quando, numa coletiva de imprensa, a TV Globo anunciou que Fátima Bernardes deixaria o “Jornal Nacional” para apresentar um novo programa, boa parte dos telespectadores brasileiros geraram expectativas sobre qual seria o resultado de uma empreitada tão arriscada. A jornalista esteve por 14 anos no comando do telejornal, ao lado de seu marido, William Bonner, o que já era considerado um status a mais para a atração, uma representação de valores familiares na televisão, elevando os dois ao nível de celebridades nacionais. Provavelmente essa característica, aliada à sempre aparente simpatia de Fátima, tenha encorajado a emissora a apostar nela como cabeça de um programa onde ela, em suas qualidades, pudesse ser mais bem aproveitada.
Seis meses de “gestação” se passaram até que o “Encontro com Fátima Bernardes” saísse do papel e entrasse na tela da TV, no dia 25 de junho. A realidade, no entanto, mostrou-se mais amarga do que as previsões. “Encontro...” estreou com pico de 11,5 pontos de audiência no Ibope (a projeção da Globo era de 15 pontos), e ainda caiu ao longo da semana: na terça (26), foram 7,2 pontos; na quarta, 6,3; na quinta, 5,6 pontos de média e na sexta, 5,4. O programa infantil do SBT, “Bom Dia & Cia.”, permaneceu na liderança da audiência a maior parte da semana, sempre com mais de sete pontos no Ibope.
Cenário tecnológico de ficção científica é a casa onde Fátima encontra seus convidados. A preocupação maior é mostrar a projeção visual criada pelo setor de arte da Globo, mesmo tendo que esconder os convidados.
Aparentemente, o telespectador ficou curioso com o que poderia sair do novo programa de Fátima Bernardes, mas preferiu não rever o que foi apresentado na estreia: um cenário de gosto questionável, uma atmosfera familiar batida, que a TV Globo não cansa de fortalecer, e uma apresentadora perdida entre várias pautas completamente diferentes. Se, em determinados momentos, alguns depoimentos beiravam o tédio de tão longos e inconclusivos, em outros era necessário correr contra o relógio para conseguir realizar o cronograma sem estourar o tempo. Faltou ritmo, e isso se fez notável para quem estava assistindo. A prova é que uma enxurrada de críticas correu a internet. Logo no dia de estreia do programa, as tags “Fátima Bernardes” e #EncontroComFatimaBernardes figuraram entre os Trending Topics brasileiros do Twitter, mas não de uma forma positiva, como se pode ver abaixo.
De fato, “Encontro...” mais parece um desencontro. Propõe-se a ter um tema semanal definido (nessa primeira semana foi escolhida a séria, porém insossa pauta sobre adoção), mas não dedica a ele sequer um terço do tempo da atração, desperdiçada com futilidades que vão do design de unhas caríssimo de madames da zona sul do Rio de Janeiro a como dobrar uma camiseta em poucos movimentos. Aliás, a abordagem superficial dada a assuntos relevantes dentro do programa contribui para uma banalização geral: quem se importa se os índios da região Norte do país estão sem terras, sofrendo violência física e passando fome quando, dentro de trinta segundos, descobriremos qual é o maior sonho dos convidados do dia? Se a atração matutina não flui e soa esquizofrênica, isso certamente se reflete no público-alvo, que ainda é uma incógnita. Talvez pessoas que não tenham o que fazer às 10h40 da manhã se identifiquem.
Um encontro com muita simpatia e pouco foco.
Provavelmente, a maior ausência do “Encontro com Fátima Bernardes” é ousadia. A Globo, acostumada a ficar dentro de sua zona de conforto, criou um programa fraco, com tons de politicamente correto e família branca-heterossexual-classe média nada impressionante. A intenção era fazer algo parecido com o “The Oprah Winfrey Show”, o talk-show de maior audiência da história da TV estadunidense? Faltaram dois ingredientes: localização temporal e espacial, afinal, a atração não surgiu ao acaso e nem gratuitamente. Oprah era uma apresentadora negra num Estados Unidos em que a segregação racial ainda era um tema delicado e as mulheres, bem como no resto do mundo, não possuíam muito espaço. Sua própria existência era uma polêmica. Já a maior polêmica de “Encontro...” foi falar de depilação masculina. Esperamos que esse seja só um mau começo.
1 comentários:
Parabéns, ótimo texto.
Flora Fernandes
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